Terça-feira, 24 de Abril de 2007

Lá em baixo

Lá em baixo ainda anda gente
apesar de ser tão noite
há quem tema a madrugada
e no escuro se afoite
há quem durma tão cansado
nem um beijo os estremece
de manhã acordarão
para o que não lhes apetece
e há quem imite os lobos
embora imitando gente
há quem lute e ao lutar
veja o mundo a andar para a frente

E tu Maria diz-me onde andas tu
qual de nós faltou hoje ao rendez-vous
qual de nós viu a noite
até ser já quase de dia
é tarde, Maria
toda a gente passou horas
em que andou desencontrado
como à espera do comboio
na paragem do autocarro

Lá em baixo ainda anda gente
apesar de ser tão tarde
há quem cresça no escuro
e do dia se resguarde
há quem corra sem ter braços
para os braços que os aceitam
e seus braços juntos crescem
e entrelaçados se deitam
e a manhã traz outros braços
também juntos de outra forma
de quem luta e ao lutar
a si mesmo se transforma

E tu Maria diz-me onde andas tu
qual de nós faltou hoje ao rendez-vous
qual de nós viu a noite
até ser já quase de dia
é tarde, Maria
toda a gente passou horas
em que andou desencontrado
como à espera do comboio
na paragem do autocarro

Lá em baixo ainda há quem passe
e um sonho que anda à solta
vem bater à minha porta
diz a senha da revolta
vou plantá-lo e pô-lo ao sol
até que se recomponha
é um sonho que acordado
vale bem quem ele sonha
lá em baixo, até já disse
que é que tem a ver comigo
e no entanto sobressalto
se me batem ao postigo

E tu Maria diz-me onde andas tu
qual de nós faltou hoje ao rendez-vous
qual de nós viu a noite
até ser já quase de dia
é tarde, Maria
toda a gente passou horas
em que andou desencontrado
como à espera do comboio
na paragem do autocarro

Lá em baixo ainda anda gente
e uma cara desconhecida
vai abrindo no escuro
uma luz como uma ferida
como a luz que corre atrás
da corrida de um cometa
e vejo vales e valados
no sopé duma valeta
lá em baixo ainda anda gente
e uma cara conhecida
vai ateando noite fora
um incêndio na avenida

És tu Maria, eu sei, já sei, és tu
qual de nós faltou hoje ao rendez-vous
qual de nós viu a noite
até ser já quase de dia
é tarde, Maria
toda a gente passou horas
em que andou desencontrado
como à espera do comboio
na paragem do autocarro

 

Sérgio Godinho

 

 

Vânia


suspirado por barbaletasguerreiras às 17:58
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4 comentários:
De MP&SM a 24 de Abril de 2007 às 18:48
Gostámos muito da visita que fizemos ao teu blog, continua... bjs


De Palma a 24 de Abril de 2007 às 21:32
Na realidade não existem regimes perfeitos porque todo o homem é imperfeito. Mas quem viveu os anos do antes do 25 pode dizer que valeu a pena. Foram tantas as mudanças que nem nos lembramos já que houve coisas inenarráveis.
Por isso os Skins de agora que nada viveram dessa época gritam aos quatro ventos a sua simpatia por Hitlers. Salazares e outros ignorando o que não viveram porque certamente ninguém os informou ou não tiveram pachorra para ler . Enfim. Que este seja um dia bom a somar aos outros que hão-de vir, certamente uns melhores outros piores. Bom blog o seu. Boa noite e bom feriado. Palma
www.Louletania.blog.vu


De bruno a 25 de Abril de 2007 às 14:55
nao sei como cá vim parar, vi um poema, reconheci, uma canção amiga, como o seu autor.
já valeu a pena aqui vir parar, dou os parabéns à pagina , e prometo voltar.

p.s: abril nunca morrerá


De Supla_girl a 25 de Abril de 2007 às 20:29
Grande blog! Parabéns!!
Visitem http://horademudar.blogs.sapo.pt/


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